"Sobre as ervas"
Respiras
como se pela garganta
deslizasse todo o azul de espanha
a noite
a língua do vento
sem outras mãos
outros olhos
para beber no escuro
Deita-te
sobre o meu peito
inclina
até ao chão
as frágeis
hastes da beleza
as palavras
onde te escondes
altas
passam
passam as águas
dóceis
do verão
É tempo
já as amoras sangram
é tempo ainda
abre-me as portas do teu corpo
oh meu amor
deixa-me entrar
já sobre ti
de aroma em aroma
os lábios todos
caem
nupciais ou mortais os corpos
são para penetrar
lenta
oh
lentamente
com duas mãos
duas rosas
duas conchas
delicadas sobre a nuca
sobre as ervas
o leite
espesso do silêncio
(Eugénio de Andrade em Véspera de Água, 1973)
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